isabelle.
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domingo, dezembro 24, 2006
terça-feira, outubro 31, 2006
quarta-feira, outubro 11, 2006
terça-feira, outubro 03, 2006
sábado, setembro 16, 2006
ou
poeira estelar.
ou
gelo fino, fino, fininho.
passos.
silêncio.
coração.
canções de gente solitária.
thin ice.
imagem.
mas no fim, só me sentia cruelmente movida por um segredo não-exposto ao caminhar daquela forma bruta, impenetrável. buscava apenas provocar. e ao sentir o peso da solidão, preguei os olhos nesse chão sujo, envergonhada e raivosa.
agora sinto as conseqüências dos meus gritos abafados. moldei minha vida já me entregando a morte. meu deus, até em meus últimos segundos antes de entrar em sono pesado de gente cansada penso em como minha vida é vazia, porque é só isso que tenho para pensar e me manter lúcida. os álbuns fotográficos que não completei, os pedidos de casamento que não recebi, o "eu te amo" que deixei de dizer quando ainda havia alguém do meu lado. sempre fui de me manter em silêncio. acho que meu silêncio nunca significou muito para as pessoas, afinal.
eu estou tão cansada de sentar a mesa sozinha, nem muitos talheres eu tenho, a não ser os de prata herdados de mamãe que nunca usei. sim, mamãe se foi, não tenho nem de quem cuidar, faço sempre comida só para um, não há quem pense em mim e sorrie denunciando minha importância. foi todo mundo indo embora dia após dia antes que eu pudesse criar boas lembranças que me sustentassem.
e então, me deram um beijo apaixonado. assustada, empurrei o rapaz com as duas mãos e te digo que não imaginava ser tão forte, o moço caiu longe. "ahh, meu segredo fora desvendado, o mistério se foi, a rotina virá, os olhares aos poucos perdem aquele ar curioso, morri e nem foram espiar o acidente, não anunciaram no jornal. ele roubou o meu samba, perdi a cor da pele, o cheiro de moça", mas isso é papo de mulher tola. eu mesma ofereci a mão para o coitado levantar, pedi minhas desculpas sem explicar o que me havia ocorrido e ele, que já me conhecia tão bem, nada questionou.
fui amando, amando intensamente a cada dia, como se estivesse a recuperar o tempo perdido, domada de um amor louco e profundo. mas não se engane, era nele que achava minha paz de espírito, não havia grade que me impedia de abrir as asas. me tornei mulher livre pois havia quem compartilhasse a dor da existência comigo, passei a me reconhecer nos olhos de um homem, e a caminhar longas horas sozinha só para voltar morrendo de saudades. minhas caminhadas agora eram repletas de sonhos, planos de viagens a dois, e eu escrevia, escrevia sem parar em bancos de praça sobre esse amor que me doía o peito.
"eu não sei. eu te amo, te amo tanto, que acredito em destino. em almas gêmeas eternas. pois se eu não acreditasse, enlouqueceria, te juro. você é lindo em minha vida, de uma forma tão inexplicável, que preciso definir de algum jeito. sempre tive essa mania, você sabe. posso pensar em tudo presente em ti que tanto me agrada, e mesmo assim meu sentimento se mostra maior. amor é isso, essa falta de limite atordoante. talvez esse papo de destino seja conversa fiada, mas você se fez único como ninguém nunca havia tentado. e hoje em dia, se alguma outra pessoa encostasse um dedo em mim, da forma como só você pode, eu sentiria nojo. se sumisses de minha vida, sei que não te acharia mais em olhar algum. não se pode abandonar uma mulher que ama, é o que eu digo sempre."
a carta nem sequer terminei, lhe entreguei apenas este trecho mesmo, e em troca ganhei um beijo longo e um "vem deitar do meu lado, amor, que só durmo com tua respiração quente no meu ouvido". então fui me deitar, que também não dormia sem minha respiração a esquentar aquela orelha fria que tanto precisava da minha voz a acalmá-la. e adormeci, a sussurrar palavras de amor.
4:48 AM
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eu gostaria que todo esse sangue que se vai não fizesse escorrer junto meu coração. porque no final das contas eu sempre me vejo almadiçoando alguém. nem que seja a mãe do infeliz que asfaltou aquela porcaria. queria uma dor mais interna. ser acusada dos meus próprios crimes. a culpa foi minha que não encurtou o vestido. entende o que eu quero dizer? entende?
está vendo? já estou prestes a te culpar por não ter alcançado minha carne crua.
não me tenho mais na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. me perdi nessa vida que de tão precária se fez ausente, dela só me sobrou o medo abafado. eu faço mesmo é parte da platéia, não torcendo pelo final feliz, mas torcendo pelo fim da peça mesmo.
não me toques, que já não quero ser tocada, meu Deus. não quero sua perfeição que aborta minha essência, não quero que jogue em minha face que sou a personificação do relativo, não quero mais suas verdades vazias porque só vazias poderiam ser suas, não me faça perder o dom de sangrar lindamente.
aqui está a fúria de uma menina. boca suja e punhos levantados. eu não sou bonita, eu não sou saudável, no momento me quero feia e doente mesmo. não para que sintam piedade de mim, pois esse cheiro enjoativo de piedade do homem que passa e me vê sentada no chão que é tão sujo quanto nós mesmos, me dá vontade de cuspir em sua face barbeada. mas para que seja atingido pelo nojo. estou aqui para provocar, só me restou o trabalho sujo.
não busco o veludo, quero tecido lavado e relavado que vive mais que o próprio dono, cheiro de sabão e gente velha.
(...)
12:22 PM
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passos firmes, porém indecisos. eu lá ousava ter certeza de alguma coisa? fui tentar a sorte no mundo, que pra gente como a gente vencer na vida era apenas questão de par ou ímpar mesmo.
a verdade é que nunca me haviam dado hora de descanso, até meu sono era inquieto e humilde. e é assim que eu fui, com meu coração a gritar por um pouco de esperança, enquanto meus pais pensavam que eu estava na mercearia a comprar cigarros.
meu pai nunca aprovou o fato de que eu fumava, dizia que não devia seguir seus vícios malditos. fumar um cigarro era sua emoção cotidiana, depois só lhe sobrava arrependimento do próprio orgasmo.
deus do céu, até hoje me arrependo de não ter inventado uma desculpa melhor, ele merecia mentira mais digna de pai, as últimas palavras que trocamos provavelmente lhe doeram o coração.
a caminhada me assustava, meus sapatos repetiam um triste som de adeus que não foi dado. eu nunca soube me livrar de nada que fosse meu, talvez por nunca ter tido muito. até hoje guardava as roupinhas apertadas, as bonecas antigas. e agora, como iria me livrar de casa, família, prato de comida, e tudo pela fraca ambição de ser alguém? apenas fui embora sem pensar demais, que o pensar só me traria uma consciência doída. minhas mãos já doem demais de tanto lavar roupa, pois que não comece a doer meu coração também, que senão sou capaz de cair no meio da rua para nunca mais querer levantar.
o amor se limitou a breves telefonemas para aliviar o peito amargurado, isso quando podia me dar ao luxo. uma vez nem sequer pude ligar para o aniversário de minha mãe. coitada, pariu cinco filhos e eles sumiram nesse mundo, nem em seu aniversário poderia dormir com o alívio de saber que seus filhos estavam bem. ao chegar o dia em que seu corpo não resistirá mais ao tempo, espero que morra dormindo e vire pluma. quero que ela receba toda essa paz que nunca pude lhe dar.
pessoas como eu sofrem dessa inquietação pelo dia de amanhã, o chão nunca está firme para nós. o mundo só se acalma quando apago as luzes de meu quarto de empregada e rezo em busca de um silêncio que não possuo em mim. os pensamentos se aliviam, o corpo parece flutuar e eu durmo, que dormir é a melhor hora do dia, por mais triste que seja afirmar uma coisa dessas, meu deus.
2:00 PM
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pois bem, fraca do jeito que parece... eu com meu cigarro recém-aceso, ela com seu café cheio de adoçante. a fumaça da nicotina parecia abafar o perfume de seu cabelo bem-lavado e se misturar ao vapor de café que queima a língua, me senti tão próxima da coitada. acabei levantando e me sentei em sua mesa, de uma forma masculina demais, acho até que lhe assustei. seu olhar, agora preso em mim, havia permanecido morto por minutos longos e sem pressa. "essa gente sempre se sente ameçada, se assusta até com a própria sombra", pensei. eu estava prestes a começar a falar grosso para magoar uma completa desconhecida, mas permaneci quieta, curiosa. quem estava se sentindo ameaçada ali era eu.
nessa hora me senti tão pálida, opaca, com inveja da simplicidade daquela mulher sentada frente a mim, de suas bochechas naturalmente avermelhadas. enquanto parecia satisfeita com o senso comum formando suas idéias apagadas, ali estava eu, que com toda minha vivência parecia haver apenas destruído sem reconstruir. a mulher a qual observava escolheu uma vida simples, já eu decidi construir até o fim de meus dias. "e a minha casa continuará incompleta, sem janela, sem porta. sem ar circulando", pensei. pensei e entrei em contradição logo depois, pois estava prestes a sair raivosa sem nada dizer, sem sequer pagar, antes que ela me perguntasse "o que foi? o que está olhando? gostou do meu vestido, quer saber onde o comprei?", mas acabei por sorrir primeiro. paguei o que devia e saí andando calmamente, em paz.
aceitei minha casa em que buracos na parede se tornavam janelas para assistir ao céu quando não conseguia dormir. aceitei o teto que pingava, a chuva molhando a mobília. me rendi a mim mesma, sorrindo. minha liberdade existia.
10:46 AM
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mas que fique bem claro que estamos falando da minha verdade, aquela que encaro com os olhos apenas entreabertos, antes que sejam invadidos pela poeira de casa abandonada.
com as mãos no bolso e o coração acelerado, encaro as fotos com pouca coragem. um olho fechado e outro aberto, se preparando para levar um susto e se fechar também. e esse meu coração que bate forte como forma de pedir alguma ajuda, quando acelera tenho medo que não volte ao normal...
pois pedi ajuda dessa vez, mendiguei incompreensão e recebi incompreensão em troca. o bonito é que eu poderia ter ganho só uma compreensão falsa da vida, mas recebi a fraqueza de alguém para se juntar com a minha. amor é esmola de mendigo pra mendigo.
mamãe estava me falando de como sente falta de quando eu era toda pequena e lhe escrevia cartas de amor com erros gramaticais. eu lhe disse que ainda a amo, apenas aprendi a escrever. choramos até, choramos juntinhas. é um amor em que a beleza me causa tontura.
eu preciso relembrar daqueles tempos. preciso relembrar, mesmo que essa tentativa de escrever acabe por se resumir em um punhado de farelos. eu preciso dos farelos mais do que o pão inteiro, ele já não mata minha fome.
quero relembrar dos sorrisos, não só vendo as fotografias. eram tão inocentes. aquele sorriso que você só encontra em criança sem vivência (essa vivência de hoje em dia, sinônima de já ter sido assaltado em pleno rio de janeiro) e que quando vem te perguntar 'mãe, você vai morrer um dia?', sente aquela vontade de chorar e abraçá-la eternamente. 'desse mundo ninguém me tira, filha'. nada mais poderoso que sorriso de criança para te desarmar.
sinto que o mundo me venceu de forma traiçoeira. ele só me provoca, sou sempre reprovada em seus testes malditos. como aquelas pessoas que deixam a prova toda em branco e a entregam com seu sorrisinho de merda. o mundo merece meu sorrisinho de merda.
já mamãe e papai mereciam meu sorriso inocente pra sempre.
(arranque a dor do peito dos dois e deposite-a em mim, que já sinto a lágrima quente descendo pela curva de meu nariz.)
4:26 PM
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então o desamparo veio, de se sentir mais leve, brutalmente abandonada. cheiro metálico que abandonava seu corpo em correnteza incontrolável. "é como se meu sangue me renegasse". se encolheu sozinha na cama ainda por fazer, marcou seus braços ao apertar as unhas contra si mesma e ali ficou.
o enjôo vinha até a boca e depois dava um passo atrás, provocante. ele ainda estava lá tentando lhe enganar, mas o sangue escorria com sua falsa timidez e denunciava a morte de quem a mulher esperaria ansiosa pelos próximos nove meses, como quem busca uma salvação.
sentiu nojo, e finalmente se rendeu a ele. o nojo era seu destino, não de mulher, mas de qualquer ave a qual haviam arrancado as asas. é isso que todos nós somos. ela finalmente sentiu a dor das asas arrancadas, a consciência da carne rasgada, aquela que gerava a livre correnteza.
por alguns instantes deixou de se sentir tola, talvez fosse até melhor morrer naquele instante tão completo. mas não, continuou ali, respirando devagar. seu destino, agora de mulher, era sofrer tendo um filho, ver o que seu próprio sangue havia criado.
e ali, após dias que se tornavam meses e que timidamente formavam seus últimos anos, ao ver a cabeça de sua cria saindo para o mundo, morreu. pariu a menina e morreu, a cabeça caída de lado. dormiu para sempre de tanto cansaço.
11:31 AM
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o pior é que se sentia pronta mesmo. conseguiu finalmente se esgotar de todas as formas possíveis. não haveria mais luta contra o inevitável.
(menina, menina, aonde foi parar sua teimosia? era tão bonita, era tão bonita.)
ao longo dos anos os detalhes são deixados de lado por quem ainda nem possui o núcleo e assiste a sua vida apenas de longe, do outro lado da rua.
precisava da essência de viver, e os olhos deixaram de contemplar as falhas do armário de madeira e as gotas que se prendiam nas janelas de seu quarto após a chuva. se esqueceu de que a essência estava era lá, pronta para quem ousasse apertar os olhos e se inclinar de forma a vê-la.
costumava ser tão detalhista, dizia não sentir medo do tempo e sempre corria na direção oposta. quanto mais rápido os anos passavam por cima de seu coração mais os encarava, nunca ousava piscar. sabia que se piscasse seu mundo se encerraria.
(menina, você abandona sua vida na esquina mais próxima e sai andando como quem não quer nada? pois você quer, e muito. se aproveitou dessa sua memória fraca e pretende agora sorrir dessa forma sem valor, porque sem valor é mais fácil.)
quem diria, o tempo a esmagou, como uma bota suja esmagaria uma formiga.
a menina era só um átomo presente nos altos prédios de concreto. 'ô, cidadezinha maldita', ela dizia. mas não diz mais, não diz mais.
8:20 PM
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